Quando eu era menino, a Air France, em parceria com o Jornal do Brasil, criou um concurso de esculturas na areia para crianças de 9 a 14 anos, cujo vencedor ganharia uma passagem para competir com crianças do mundo todo em La Baule, na França. Meu pai, que adorava ensinar, e minha mãe, que adorava a vida e seus desafios se empenharam em me preparar com minha irmã para vencer a prova. Meu pai fabricou ferramentas apropriadas em seu atelier, enquanto minha mãe nos falava de escultura, proporção, materiais e teoria da arte em geral. Ir à praia se tornou um trabalho e para nós foi muito divertido. Construíamos de tudo; castelos, sereias, igrejas, figuras mitológicas, enquanto ouvíamos as críticas e ensinamentos dos dois. As pessoas em geral, curiosas, vinham se aproximando aos poucos para ver a gente dar forma aos montes de areia. Eu ficava todo prosa com aquela gente nos admirando. Porém, rapidamente descobri que elas não estavam ali para nos admirar, mas esperavam ansiosas para destruir nosso trabalho. Era batata. Mal a gente se afastava um pouco, elas corriam, chutavam a areia, pulavam frenéticas, pisoteavam a areia e só se acalmavam quando não restava mais sombra do que havíamos feito. Revoltado, eu pedia a meu pai que os impedisse de alguma maneira. Ele então me respondia calmamente que as pessoas em geral gostavam de destruir, pois destruir é muito mais fácil que construir, e aproveitava pra nos ensinar: “Nunca destruam o que vocês não sabem construir melhor”. Não pude deixar de lembrar disso ao conhecer a obra de Rauschenberg, “An Erased De Kooning”. Rauschenberg nos anos 50, jovem iniciante, fez uma série de quadros totalmente brancos, e ainda nessa corrente minimalista, pensou em realizar uma obra às avessas, uma obra resultante do apagamento de outra obra. Começou então a desenhar e apagar seus desenhos. Em seguida pensou que deveria apagar a obra de um pintor mais conhecido e respeitado do que ele, para que o seu trabalho tivesse valor. Tomou coragem e foi pedir a de Kooning, artista já muito famoso, que lhe desse um trabalho para ele apagar. Inicialmente, como era de se esperar, de Kooning não gostou da ideia, mas depois acabou por concordar e lhe deu um trabalho feito a lápis, carvão e óleo, bem difícil de ser apagado. Rauschenberg precisou de dois meses e muitas borrachas para conseguir reduzir o trabalho de de Kooning a um papel quase branco, que ele emoldurou e pediu a seu amigo Jasper Jones que escrevesse: “Erased de Kooning Drawing, Robert Rauschenberg, 1953”.
Hoje, no acervo do Museu de Arte Moderna de São Francisco, o de Kooning apagado é uma das obras mais conhecidas de Rauschenberg. Para uns um crime, um ato de vandalismo, para outros um protesto contra a Arte, contra ou expressionismo abstrato. Para o próprio Rauschenberg, poesia. Esta obra é talvez o exemplo máximo da ante-obra, da arte do nada. A representação de uma realidade paralela à esta dos sentidos. Influenciado por Rauschenberg, John Cage fez a composição “4.33”, que consiste em quatro minutos e trinta e três segundos de silêncio. Destruição ou construção, Rauschenberg mostrou que pode existem várias maneiras de se construir, e que agindo com estilo, qualquer coisa pode se tornar Arte e, por falar nisso, não posso deixar de citar uns versos do poema “Style” de Bukowsky."Style is the answer to everything. A fresh way to approach a dull or a dangerous thing. To do a dull thing with style is preferable than to doing a dangerous thing without it. To do a dangerous thing with style is what I call art. Bullfighting can be an art. Boxing can be an art. Loving can be an art. Opening a can of sardines can be an art."
Ta Otimo! Me lebrei de Wilde's: In matters of grave importance, style, not sincerity, is the vital thing.”
ResponderExcluirWell done!