domingo, 23 de junho de 2013

DUCHAMP – De “anartista” a  “artista do século”.


A história da Arte é a história das transgressões artísticas. Geração após geração, artistas vêm revirando, remexendo, transgredindo os conceitos estabelecidos que pareciam até então eternos. Para citar somente alguns de diferentes épocas: Giotto introduzindo o espaço e realismo nas figuras humanas, o Caravaggio trazendo realismo e trivialidade aos santos, Constable elevando a paisagem a “gênero”, Courbet com temas triviais e mesmo chocantes, pintados com realismo, intrigaram e as vezes escandalizaram seus contemporâneos. Como mostra Nathalie Heinich (Le Triple Jeu de L’Art Contemporain) com Manet, começa uma nova transgressão, não mais ligada ao tema, mas à maneira de pintar, uma transgressão das convenções picturais. A partir de então, o público que antes acusava um pintor de desrespeitoso, passa a julga-lo como inepto. Inicia-se um grande processo de desconstrução dos princípios que definiam a obra de arte. Impressionismo, surrealismo, dadaísmo, expressionismo, futurismo, minimalismo entre outros, procuraram à sua maneira transgredir os limites da obra de arte, instigando e provocando o público que os acusava de não saber pintar. Em 1913, Duchamp trazendo objetos encontrados ou peças industriais, seus “readymade” para os museus, transgride a própria noção da criação artística, e a noção de autoria.  A obra de arte passa a ser qualquer coisa que “O Artista” diz que é arte. Duchamp se diz um “anartista” (palavra que ele mesmo criou) e paradoxalmente se torna um dos artistas mais importantes do sec XX (o artista do século eleito em 1980 pela New York Review of Books), construindo sua carreira e sua fama de artista na negação da Arte.  Acontece que elevando um urinol à categoria de obra de arte, Duchamp abre caminho para que todos os urinóis do mundo se tornem obra de arte, à condição que sejam expostos como tal. Mas tirando aqueles que não enxergam que “o rei está nu”,  todos se dão conta que nenhum urinol é mais artístico que outro, e logo se o urinol de Duchamp “é arte”, todos os outros, assim como qualquer objeto industrial ou “qualquer coisa é arte”.  Porém, apesar de Duchamp e do urinol, 100 anos depois, artistas continuam a criar, e hoje em dia podemos constatar com certa tranquilidade, que os movimentos de vanguarda e a negação da arte não passam de uma vertente, um questionamento que também pode ser questionado. As grandes verdades provaram que não são tão grandes assim e que a arte como água represada, encontrará sempre um caminho para continuar a fluir.

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